por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Mano Brown: líder dos Racionais MCs. Músico e pensador paulistano que se manifesta no movimento hip-hop.
Favela do Moinho: é aquela que pegou fogo dois dias antes do Natal, na região central de São Paulo. Com dois mortos oficiais – e vários outros, na versão dos moradores exposta neste vídeo.
Mano Brown faz show hoje na Favela do Moinho. O Festival Moinho Vivo começa às 14 horas, com música, fotografia, artes circenses. É um acontecimento cultural – e político. Apesar da dupla importância, a grande mídia não fará a cobertura.
Somente Mano Brown toca hoje no Moinho? Não. O festival terá também Dexter e Rincon Paciência. Quase teve Emicida. Terá ainda Crônica Mendes, DeDeus, Ducorre, James Bantu, Lindomar 3L, Ortiz, Rimatitude, Sombra, e Us VCagabundo Chic. E b-boys, Ds, grafiteiros, poetas. Mas não sairá nas telas da Rede Globo.
Os organizadores esperam toneladas de mantimentos – destinados aos desabrigados - e centenas de medicamentos. Os jornalistas especializados em “sustentabilidade”, porém, lá não estarão. Cadernos especializados em “Cidades”, “Metrópole”, “Cotidiano”? Pouco provável que façam jus a seus nomes.
No início do ano a prefeitura tentou implodir o prédio ao lado da Favela do Moinho, na região central de São Paulo. A implosão falhou, mas o prefeito Gilberto Kassab (PSD) ainda assim deu nota 10 para a operação.
Em meio à invisibilidade nos principais meios de comunicação do país, os organizadores do Festival Moinho Vivo fazem uma cobertura colaborativa. Nos mesmos moldes do que aconteceu nos últimos dias na Ocupação Pinheirinho, em São José dos Campos. Aliás, haverá show hoje também no Pinheirinho. Às 16 horas, com a cantora de rap Lurdes da Luz.
O próprio nome do festival de hip-hop, Moinho Vivo, tem embutido um significado de resistência. Veja a definição no site Hip-Hop Brasil:
- Moinho Vivo é uma iniciativa autogestionária de produtores, militantes, moradores e ativistas que querem dar visibilidade ao que acontece na Comunidade do Moinho (pós incêndio). Compartilhando informações, denúncias e principalmente todo o potencial criativo e produtivo da Comunidade.
Um Moinho e um Pinheirinho vivos contrapõem-se aos meios de comunicação tradicionais – semi-mortos. Por quê?
A EXCLUSÃO MIDIÁTICA
O primeiro motivo da exclusão midiática é o próprio conteúdo político. Jornalismo cultural e jornalismo político são planetas distantes nas redações. Não há diálogo. Como falar de entretenimento no jornalismo político? É considerado um assunto “menor” – apesar do festival de fofocas que caracteriza a cobertura política brasileira.
Da mesma forma, a política só entra no jornalismo cultural como contrabando. Até entra, aqui e ali – por distração dos chefes de redação (poucos deles realmente ilustrados) ou porque se considera que o fato político já foi amestrado pela indústria cultural. Como se o registro das contradições do país em livro ou vídeo fosse a parte que coubesse aos excluídos no latifúndio político-cultural.
Mas vale ressaltar também o aspecto econômico por trás da invisibilidade de fenômenos como o do hip-hop paulistano. Pois não se trata de algo exatamente simpático às gravadoras – como é Michel Teló.
Claro, Teló é também mais inofensivo. Pense na letra de “Ai, se eu Te Pego”. Agora leia estes versos de “Num é só ver”, de Emicida e Rael da Rima:
"Empresários perdem milhões
Pobres acham, devolvem
Barões matam nações
Que se refazem, se movem
Manipulam informações
Fodem!
Grandes populações
Que não se envolvem
Trancados em mansões
É, eles podem
Seguros das monções
Oh right, no problem
Epidemias, liquidações
Dormem pessoas simples nos barracões
Orem
Calam manifestações
Olhem
Por cifras, com vidas
Não estranhe que joguem
Atrás de notícias compradas
Se escondem
Sem dó tiram comida
De outro homem
Artistas fazem rir
Presidentes fazem chorar
Tiros são barulhentos
Mas não impedem de escutar
O canto dos que lutam pelo povo
Sempre vivo
Gente louca faz música
Gente séria explosivo".
Muito mais elaborado que Teló? Expressivo? Relevante? Importante? Sim, mas não somente isso. Basta observar que Emicida tem posição declarada contra o latifúndio. Rincon Paciência fala em rap “resistente”.
Para quem luta pela manutenção do status quo, deve soar inquietante.
Festival Moinho Vivo
Quando: domingo (22), a partir das 14h
Onde: Favela do Moinho – R. Doutor Elias Chaves, 20 (próx. Viaduto da Avenida Rio Branco)
Quanto: doações de alimentos, roupas, materiais de construção, materiais escolares, brinquedos ou remédios.
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