Esquerda modista não está nem aí para novo Amarildo
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Quem
lamentará o destino do frentista João Paulo? Ele está desaparecido
desde o dia 30 de setembro. Câmeras registram o momento em que três
policiais militares de Fortaleza o colocam na viatura. Nunca mais foi
visto.
O caso é similar ao do pedreiro Amarildo, no Rio.
Amarildo Dias de Souza, morador da Rocinha, foi detido na porta de sua
casa, em julho de 2013, para ser levado à sede da Unidade de Polícia
Pacificadora. Sumiu.
João Paulo de Sousa Rodrigues possuía um
sobrenome – Sousa – idêntico ao de Amarildo. Este, Souza. Com “z”. Mas
sem que seu sequestro pelo próprio Estado tenha gerado alguma comoção.
Mesmo tendo sido noticiado pelo Jornal Nacional:
http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2015/10/tres-policias-suspeitos-sao-presos-por-desaparecimento-de-frentista-no-ceara.html
Por anos pensamos e escrevemos que a falta de notícias nos
principais veículos de comunicação era um problema central na
perpetuação de nossa desigualdade. “Ah, se todo mundo soubesse...” Mas e
quando um caso importante vira notícia no principal jornal da Globo e
passa despercebido?
O título deste artigo se refere à
indiferença específica da esquerda modista. Essa Esquerda Amarildo
Guarani Kaiowá, com suas indignações sazonais, seu culto a ondas
meméticas de suposta conscientização e comiseração coletiva. Esquerda
movida a arroubos. Modinha. Engraçadinha.
Claro que o
desaparecimento de um cidadão sob as asas do Estado não deveria ser um
tema apenas daqueles que se consideram de esquerda. Qualquer um com um
mínimo de noção democrática deveria estar perplexo. (Imaginem se o filho
de um governador tivesse sido sequestrado.)
Longe disso: João
Paulo continua invisível. Se nem aqueles mais acostumados a denunciar a
violência policial, ou os mais cientes de que há um genocídio da
juventude pobre (e negra), dão a ele alguma atenção, o que esperar dos
demais? Apenas shows adicionais de despolitização.
A não ser que
a foto de João Paulo se torne um meme. Ou quando ela ganhe gradações
cromáticas, quando for veiculada sua foto como criança. Quando criarem
uma hashtag muito legal. #cadêJoãoPaulo #ondeestáJoãoPaulo
#somostodosfrentistas
Ou os manifestantes de 2013 apenas surfaram na imagem de Amarildo?
Outra
pergunta: o que o governador Camilo Santana (PT) tem a dizer sobre o
desaparecimento do frentista? (Desta vez não foi a polícia do Cabral.
Nem a do Pezão. Já tivemos Copa e o governador pertence ao Partido dos
Trabalhadores.)
Algo está muito invertido neste país. É mais
fácil vermos uma pichação racista no banheiro de uma universidade
paulistana ser replicada – divulgando a mensagem do racista – do que
indagações sobre o desaparecimento de um jovem. Que nem sabemos se ainda
está vivo.
João Paulo morreu de antemão. Simbolicamente.
Duplamente sequestrado, em plena democracia (essa espécie de democracia
do entretenimento), por policiais cearenses e por nossa insustentável
frivolidade.
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