quinta-feira, 10 de maio de 2012

O que é notícia? Mulher que não pagou pensão ou mobilização contra exploração sexual?
 
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
 
Alguns jornais de hoje dão na capa a notícia de que uma mulher grávida, com o filho prestes a nascer, foi presa por não pagar pensão “ao ex-marido”. A notícia não é exata: a pensão é para a filha. A condição de ex-marido não é a que importa, mas sim a de pai. Diariamente pais são presos por não pagar pensão. A medida pode ser questionada, claro – mas para ambos os sexos. De resto, trata-se de sensacionalismo.
 
Esse sensacionalismo fica mais evidente se pensarmos numa notícia que não foi dada. A de que, ontem, um encontro da Rede Nossas Crianças discutiu o enfrentamento ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes. Foi tirado um documento a ser enviado para autoridades de 44 municípios onde a rede (que atente 61 mil crianças e adolescentes em 11 Estados) está presente.
 
(Esses dados foram divulgados pelo Correio Braziliense, com texto da Agência Brasil, mas foram ignorados pelos principais jornais.)
 
Estamos a oito dias do Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infantojuvenil. Se os jornais querem, de fato, discutir temas familiares, está aí uma ótima oportunidade. Não é o único, evidentemente. A violência contra a mulher deveria ser também um tema prioritário – e não apenas nas proximidades do dia 8 de março.
 
Mas é mais fácil explorar um caso (um único caso) de uma mulher presa por não pagar a pensão. E de forma distorcida – como se tratasse de um privilégio a um “ex-marido”, e não de uma negligência em relação à filha.
 
Enquanto isso, as crianças e adolescentes brasileiros seguem como as vítimas mais inocentes da violência estrutural de nosso país. Em São Paulo (e não nos grotões), informou ontem a psicóloga Maria Inês Rondello, 61% dos abusados são do sexo feminino e 39% do masculino.
 
Informa a Agência Brasil (da EBC, do governo federal) que, entre as meninas, 17% das vítimas têm até 5 anos, 45% de 6 a 10 anos. Mais da metade. Entre os meninos, pior ainda: 15% estão na faixa etária até 5 anos, 51% de 6 a 10 anos.
 
E quais os tipos de violência? Os dados da psicóloga mostram que 44% referem-se a abuso sexual; 2%, exploração sexual; 21% negligência (e nem estamos aqui falando de pensões não pagas); 20%, violência física e 13%, violência psicológica.
 
Barbárie, claro. Tudo sempre sob o silêncio eloquente da grande imprensa. Como serão esses brasileiros e brasileiras desde cedo violentados?
 
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