O que é notícia?
Mulher que não pagou pensão ou mobilização contra
exploração sexual?
por ALCEU LUÍS CASTILHO
(@alceucastilho)
Alguns jornais de hoje
dão na capa a notícia de que uma mulher grávida, com o filho
prestes a nascer, foi presa por não pagar pensão “ao ex-marido”.
A notícia não é exata: a pensão é para a filha. A condição de
ex-marido não é a que importa, mas sim a de pai. Diariamente pais
são presos por não pagar pensão. A medida pode ser questionada,
claro – mas para ambos os sexos. De resto, trata-se de
sensacionalismo.
Esse
sensacionalismo fica mais evidente se pensarmos numa notícia que não
foi dada. A de que, ontem, um encontro da Rede Nossas Crianças
discutiu o enfrentamento ao abuso e à exploração sexual de
crianças e adolescentes. Foi tirado um documento a ser enviado para
autoridades de 44 municípios onde a rede (que atente 61 mil crianças
e adolescentes em 11 Estados) está presente.
(Esses dados foram
divulgados pelo Correio Braziliense, com texto da Agência Brasil,
mas foram ignorados pelos principais
jornais.)
Estamos a oito dias do
Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual
Infantojuvenil. Se os jornais querem, de fato, discutir temas
familiares, está aí uma ótima oportunidade. Não é o único,
evidentemente. A violência contra a mulher deveria ser também um
tema prioritário – e não apenas nas proximidades do dia 8 de
março.
Mas é mais fácil
explorar um caso (um único caso) de uma mulher presa por não pagar
a pensão. E de forma distorcida – como se tratasse de um
privilégio a um “ex-marido”, e não de uma negligência em
relação à filha.
Enquanto isso, as
crianças e adolescentes brasileiros seguem como as vítimas mais
inocentes da violência estrutural de nosso país. Em São Paulo (e
não nos grotões), informou ontem a psicóloga Maria Inês Rondello,
61% dos abusados são do sexo feminino e 39% do masculino.
Informa a Agência
Brasil (da EBC, do governo federal) que, entre as meninas, 17% das
vítimas têm até 5 anos, 45% de 6 a 10 anos. Mais da metade. Entre
os meninos, pior ainda: 15% estão na faixa etária até 5 anos, 51%
de 6 a 10 anos.
E quais os tipos de violência? Os dados da
psicóloga mostram que 44% referem-se a abuso sexual; 2%, exploração
sexual; 21% negligência (e nem estamos aqui falando de pensões não
pagas); 20%, violência física e 13%, violência psicológica.
Barbárie, claro. Tudo sempre sob o
silêncio eloquente da grande imprensa. Como serão esses brasileiros
e brasileiras desde cedo violentados?
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