quarta-feira, 4 de julho de 2012

Ernesto Sabato mostra por que é impossível explicar conceitos avançados da física

O escritor argentino Ernesto Sabato (1911-2011) foi um físico consagrado, antes de se dedicar à literatura. Em Paris, trabalhou no laboratório dos Irmãos Curie. Sua convivência com os surrealistas foi decisiva para abandonar a ciência – e se tornar um crítico ferrenho dela.

É a ciência um assunto recorrente em seus ensaios. Em “Nós e o Universo” (1945), ele escreveu algo sobre a teoria de Albert Einstein que se encaixa perfeitamente em discussões contemporâneas. Por exemplo, a “partícula de Deus”, recém-descoberta por cientistas, anunciada hoje em Genebra.

Segue o tópico do ensaio, intitulado “Divulgação”:

 
“Alguém me pede uma explicação da teoria de Einstein. Com muito entusiasmo, falo de tensores e geodésicas tetradimensionais.

- Não entendi uma única palavra – me diz, estupefato.
 
Reflito um instante e logo, com menos entusiasmo, dou uma explicação menos técnica, conservando algumas geodésicas, mas fazendo intervir aviadores e disparos de revólver.
 
- Já entendi quase tudo – diz meu amigo, com bastante alegria. - Mas há algo que ainda não entendo: essas geodésicas, essas coordenadas...
 
Deprimido, mergulho em uma longa concentração mental e acabo por abandonar para sempre as geodésicas e as coordenadas; com verdadeira ferocidade, me dedico exclusivamente a aviadores que fumam enquanto viajam à velocidade da luz, a chefes de estação que disparam um revólver com a mão direita e verificam tempos com um cronômetro que têm na mão esquerda, a trens, sinos e vermes de quatro dimensões.
 
- Agora sim, agora entendi a relatividade! - exclama meu amigo com alegria.
 
- Sim – respondo amargamente -, mas agora não é mais a relatividade”.
 
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