sexta-feira, 2 de março de 2012

Domingo haverá comício do Serra no Largo dos Curros

por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)

Macunaíma sobrevive em José Serra. “É por isso que eu digo a vocês: vou ser candidato a presidente. Que é parecido com ser candidato a governador. Ah, mas que preguiça. Pode ser alcaide mesmo. O quê, prefeito? Mudou?”



Que se reconheça, antes de mais nada, o mérito do candidato. Criar dois bordões tão pegajosos quanto esses numa mesma sequência não é para qualquer um. Um deles é imbatível, melhor do que “Lucia, aquela que está no Canadá”. O quê? Não é Lucia o nome dela? “Mudou?”

O outro bordão também é muito bom. A cada gafe, primeiro faremos a tal pergunta: "Mudou?" Em apenas uma tarde de sexta-feira ela já se tornou um clássico. Mas em seguida completaremos com o bordão seguinte. “Que é parecido com...”

Imaginemos um reitor muito distante, por exemplo, falando do regime militar (1964-1985). Algum reitor de alguma suposta universidade muito longínqua: “E todos sabemos que a revolução de 64 foi um período em que...”

“Mas, reitor... não era revolução de 64. Foi um golpe”. Agora ninguém precisa mais perder as estribeiras: “Golpe? Mudou? Então tá, golpe, que é parecido com revolução, tá certo?”

Não estou apenas contando piadas – ou seja, o blog não mudou de perfil. Estou falando de nossa política à Macunaíma, da velocidade incrível com que os nossos políticos mudam seus discursos de acordo com as conveniências – pequenas ou grandes correções de rota, de acordo com a reação imediata da imprensa. Ou do eleitorado.

A fantástica graça de José Serra durante a entrevista com Boris Casoy pode ser vista apenas como tal, claro. E terá nos divertido à beça numa tarde chuvosa de uma sexta-feira de verão.

Mas não é isso mesmo que eles fazem diariamente? Desdizer as promessas, recuar das convicções, abandonar os discursos anteriores da forma mais macunaímica possível? Imaginem Grande Otelo interpretando um político e perguntando: “Mudou?”

Esse personagem, devemos reconhecer, não cabe apenas em Serra. Quanta gente esqueceu o que escreveu, o que estudou, o que prometeu, e fica por isso mesmo. Mas sem o Boris Casoy para corrigir.

(É claro que falou mais alto a Casoy o instinto jornalístico de correção, mais até do que o tradicional servilismo ao grupo político de José Serra.)

A correção às barbaridades de nossos políticos não costuma ser feita. Editores e diretores de redação costumam abafar os instintos dos jornalistas que, eventualmente, corrijam os poderosos de plantão. Fica quase “feio” fazer uma intervenção à Casoy: “Candidato, mas isso que o senhor está dizendo é uma inverdade”, ou “uma monumental bobagem”, ou “não foi isso o que o senhor disse em 2002, quando...”

Está todo mundo muito adestrado. O próximo comício de Serra na Avenida Águas Espraiadas (“o quê, Roberto Marinho? Mudou?”), no sábado, e o comício do candidato no Largo dos Curros (“que é parecido com Praça da República, tá certo?”) estarão repletos de palavras vaporosas, promessas imprecisas, discursos distraídos. Mas quem liga?

Afinal, ele é apenas o candidato do PSD à presidência dos Estados Unidos do Brasil. Ou não é isso? Mudou? PSDB? Brasil? Prefeitura?

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