segunda-feira, 5 de março de 2012

Os “novos Pinheirinhos” em São Paulo e os velhos esquecimentos
 
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
 
Na sexta-feira duas novas ocupações de sem-teto em São Paulo, em Embu das Artes e Santo André, levaram o nome de “Novo Pinheirinho”. O fato merece uma análise do ponto de vista político e do ponto de vista da comunicação. Ao reviver o nome Pinheirinho o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) faz um movimento duplo: de valorização política das novas ocupações e de luta contra o esquecimento de uma violência.
 
Comecemos com o esquecimento. Neste início de março, quantas barbaridades recentes contra brasileiros pobres já foram esquecidas? Os abusos na Cracolândia praticamente já saíram do noticiário. A Favela Moinho Vivo, que pegou fogo em São Paulo antes do Natal, também não alcança mais a nossa imprensa desmemoriada. Violências contra indígenas nem se fala: antes de serem esquecidas, muitas nem foram noticiadas.
 
É nesse sentido que o nome “Novo Pinheirinho” tem um primeiro mérito. A desocupação em São José dos Campos será sempre uma realidade para cada família desabrigada - e brutalmente expulsa naquele domingo de janeiro em São José dos Campos. Tornou-se um símbolo do abuso estatal, da violência institucional. Para o procurador Marcio Sotelo Felippe, o governador Geraldo Alckmin, Naji Nahas e o presidente do Tribunal de Justiça, Ivan Sartori, devem ser presos por crimes contra a humanidade.


Temos aí, portanto, no marketing do MTST, o mérito de manter a história viva. A acampamentos e assentamentos com nomes como Chico Mendes e Zumbi dos Palmares soma-se agora o nome de uma ocupação emblemática: Pinheirinho.
 
O segundo mérito é o de unificar lutas – dispersas – por moradia. Claro que elas sempre tiveram como matriz os mesmos problemas (a brutal desigualdade de renda no Brasil, a segunda estrutura fundiária mais concentrada do planeta etc). Mas a falta de unificação dos movimentos faz cada reivindicação soar como isolada.
 
Talvez a sociedade brasileira já tenha – sordidamente – assimilado sem-terra e sem-teto apenas como tais. Suas causas (moradia, terra) são justas e emergenciais, mas a classe média e as elites naturalizaram a ausência de terra e de teto. Como se isso fosse uma condição eterna, e não historicamente construída – a partir de políticas excludentes diárias.
 
Ao multiplicar os Pinheirinhos, portanto, o MTST (ainda que seja só o MTST, e não um conjunto de movimentos de sem-teto), expande geograficamente uma tragédia que não é só localizada em São José dos Campos.
 
O quanto os meios de comunicação vão perceber disso tudo, não se sabe. A tendência da mídia hegemônica é a de dispersar – despolitizar – as causas. Tratar tudo como ato isolado, pontual, não como parte de uma grande tragédia nacional.
 
O mesmo vale para outras expressões da violência brasileira do dia a dia: contra indígenas, quilombolas, homossexuais, negros etc. Casos individuais são eventualmente amplificados. O conjunto da violência contra minorias ou contra excluídos, porém, quase não é exposto.
 
Para discutir esse conjunto não dá para ser superficial: é preciso aprofundar o debate político e econômico. E, por que não dizer, o debate constitucional. O embate entre o “sagrado” direito à propriedade e os direitos elementares consagrados na Constituição: direito à vida, à moradia, à saúde, educação...
 
A violência contra sem-teto não começou no Pinheirinho. Mas que ele ao menos sirva de referência. Contra novas desocupações, novos incêndios, novos higienismos, velhas agressões diárias de uma sociedade intrinsecamente excludente.

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