sábado, 21 de janeiro de 2012

São Paulo, 458 anos
Drama das Secas” era projeto de Josué de Castro e Cesare Zavattini

A obra de Rodolfo Nanni não é extensa. Ele já foi chamado de cineasta bissexto. Mas já se declarou “menos que isso” – diante das dificuldades para filmar no Brasil. Foi delicadamente biografado pela jornalista Neusa Barbosa como “um diretor persistente”.

Nanni fez dois longa-metragem de ficção. Ambos foram premiados. “O Saci”, quatro vezes. Ganhou o prêmio homônimo, oferecido pelo Estadão, o jornal mais tradicional da cidade; o prêmio Governador do Estado de São Paulo; o prêmio Curumim, do jornal carioca Diário de Notícias; e o prêmio Índio, do Jornal de Cinema. Todos em 1954.

Veja aqui um trecho do filme, onde Narizinho é transformada em pedra pela Cuca:


“Cordélia, Cordélia” (1971) foi baseado em peça de Antonio Bivar. O filme levou o Prêmio Especial de Qualidade do Instituto Nacional de Cinema. Lilian Lemmertz foi eleita a Melhor Atriz no prêmio Coruja de Ouro.


Nanni também foi laureado pelo curta “Realidade de um Plano” (1962). Era o prêmio Municipalidade de São Paulo. “Os Vencedores” (1968), feito para o Instituto Nacional de Cinema, documentou os filmes e realizadores brasileiros contemplados em festivas internacionais. Foi exibido no Festival de Veneza, naquele mesmo ano.

O DRAMA DAS SECAS

Mas foi Em 1958 que Rodolfo Nanni realizou seu projeto mais ousado: o documentário “O Drama das Secas”. Filmado no interior de cinco Estados nordestinos (BA, PE, CE, PB e RN), o filme foi patrocinado pela Associação Mundial da Luta Contra a Fome.

A obra foi feita em parceria com ninguém menos que Josué de Castro. O autor de “Geografia da Fome” era diretor da FAO, o órgão da ONU voltado para a alimentação – curiosamente, hoje, dirigido por outro brasileiro, José Graziano da Silva.

O projeto original era um filme assinado por vários cineastas, sobre a fome no mundo. Um desses diretores seria Roberto Rossellini – um dos diretores que mais revolucionaram a sétima arte, peça-chave do neorealismo italiano.

“Partimos do Recife, com dois jipes do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas”, conta o diretor no site do filme “O Retorno”:

- Levamos uma câmera 35mm e algumas latas de negativo, prontos para registrar a miséria e a fome endêmica de toda uma população. Percorremos uma grande parte dos estados de Pernambuco, Ceará e Paraíba, num percurso de cerca de 4 mil quilômetros.

Eles passaram por pequenas cidades, “de uma pobreza inimaginável e de imensos territórios onde não havia nada, além da terra seca, rachada, leitos secos de rios”. “Animais mortos e pessoas, velhos, jovens e crianças sub-nutridas”, relata. “Uma paisagem de desolação”.

O filme foi exibido nas principais capitais europeias. Ganhou o prêmio “Saci”, em 1960 (o prestigiado prêmio do Estadão), e o prêmio “Municipalidade de São Paulo”, no mesmo ano.

O CINEMA ITALIANO

O idealizador de “A Geografia da Fome no Mundo” foi Cesare Zavattini, o maior roteirista do neorealismo - escola que também ajudou a fundar. Foi ele quem assinou as melhores obras do diretor Vittorio de Sica, como “Ladrões de Bicicleta”, “Milagre em Milão” (leia aqui uma análise sobre a atualidade do filme) e Umberto D.

- O Zavattini queria fazer um filme internacional sobre o problema da fome no mundo, inspirado no livro "Geopolítica da Fome", do Josué de Castro. Eu fui convidado para fazer a parte referente ao Brasil. Acontece que só nós é que fizemos. E dei o nome de "Drama das Secas". O restante do projeto não aconteceu.

Rodolfo Nanni estudou na França, no Institut des Hautes Études Cinematographiques. Mas foi o cinema italiano – sua estética e seu compromisso – que reverberou em sua obra:

- Minha referência, naquela época, foi justamente a da explosão do formidável cinema italiano. Tive relações pessoais com Zavattini e boa amizade com Sergio Amidei (autor de "Roma Cidade Aberta", de Rossellini).

Nanni conta que esteve junto com Rossellini no Brasil. “Ele também tinha planos de
filmar no nordeste, inspirado no livro do Josué de Castro”.

O diretor voltou 50 anos depois ao Nordeste, para fazer "O Retorno". O filme contém várias cenas de "O Drama das Secas". Veja o trailer:


Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

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