Sobre o Estadão, João
Rodas e José Sarney – da USP ao Maranhão
por ALCEU LUÍS
CASTILHO (@alceucastilho)
Trabalhei por muitos
anos no Estadão. Não é o pior dos veículos conservadores deste
País. Consegue até obter algum respeito de setores de esquerda, por
conseguir ser mais honesto (segundo esses setores, MST inclusive) que
jornais como a Folha (que seria mais hipócrita) e veículos como a
Veja – este, quase hoje por aclamação entre os mais bem
informados, o grande detrito editorial do Brasil.
Mas o editorial desta quarta-feira do jornal, aliado a um artigo do editorialista José Nêumanne, motivam um sinal de alerta em relação à linha adotada pelo jornal paulista. Atenção, senhores editorialistas, senhora Marcia Guerreiro (minha colega de Facebook): vocês têm tanta certeza assim de que João Grandino Rodas está do lado da democracia?
E de que somente a
“extrema esquerda” esteja questionando modelos militarizados de
polícia, repressões e abusos não somente na Cidade Universitária,
mas em todo o País?
O Estadão ajudou a
fundar a USP. Como uma universidade, aliás, a serviço das elites.
Quem já deixou isso claro foi nada menos que o historiador Fernand
Braudel – da missão francesa que veio legitimar a Universidade de
São Paulo. Somente com o tempo a universidade abrigaria (e de fato
abriga) representantes de classes mais baixas (mas nunca na chefia da
reitoria).
Talvez por esse vínculo
afetivo com a USP o jornal esteja avançando o sinal em relação a
Rodas, o reitor biônico. Seria uma posição ingênua do vetusto e
centenário jornal? Vejamos.
O Estadão, que
rejeitou o acirramento da repressão durante a ditadura militar,
talvez possa lembrar que o reitor da USP deveria ser o senhor
Glaucius Oliva, atual presidente do CNPq. Pois João Rodas foi apenas
o segundo mais votado pela comunidade acadêmica. O governador José
Serra escolheu o segundo colocado– e aqui nem estou falando de
eleições diretas, hoje inexistentes.
O Estadão coloca-se
como vítima do regime militar – o de 1967, não o de 1964. E foi.
Coloca-se também como censurado – está desde o dia 31 de julho de
2009 sem poder publicar informações sobre a Operação Boi Barrica,
que investiga a família do senador José Sarney (PMDB-AP). E, de
fato, o jornal está sendo censurado – merece, nesse aspecto, o
apoio incondicional de todas as forças democráticas do País.
Pois, caros
editorialistas, o senhor João Grandino Rodas nada fica devendo ao
senhor José Ribamar Ferreira da Costa Araújo - o Sarney. João e
José, José e João, ambos estiveram do lado da ditadura militar que
vocês combateram. O Estadão chegou a publicar receitas de bolo nos
jornais para indicar que os militares praticavam censura. Mas Rodas e
Sarney, Sarney e Rodas, família Mesquita, possuem a mesmíssima
matriz: eles mandam no Maranhão e na USP como se fossem os quintais
de suas casas. Sem consultar ninguém.
Todos sabem que Sarney era da Arena. Mas poucos sabem que Rodas votou contra as vítimas da ditadura. Confiram nesta reportagem publicada no jornal Brasil de Fato.
Todos sabem que Sarney era da Arena. Mas poucos sabem que Rodas votou contra as vítimas da ditadura. Confiram nesta reportagem publicada no jornal Brasil de Fato.
A USP está se tornando
um Maranhão. Por lá, no Estado com quatro senadores, a legalidade é
mandada às favas, na medida em que até a toponímia local se dá à
margem das leis brasileiras. E dá-lhe Ponte José Sarney, Tribunal
de Contas Roseana Sarney, Forum Trabalhista José Sarney, e assim por
diante. São homenagens (eleitoreiras, aliás) a pessoas vivas –
algo vedado pela legislação brasileira. Mas vá ao Maranhão
protestar contra eventuais abusos de poder para ver se os principais
jornais locais vão publicar.
Na Cidade
Universitária, policiais entraram (antes mesmo do convênio assinado
por Rodas, antes mesmo da morte do aluno da FEA) para reprimir
estudantes – e até mesmo funcionários e professores, os netos de
Braudel e Lévi-Strauss, os filhos de Florestan Fernandes e Fernando
Henrique Cardoso.
Até este jornalista (não exatamente de extrema esquerda) foi abordado de forma humilhante, em frente da FEA, uma semana após o assassinato do estudante de Ciências Contábeis. “Mãos à cabeça. Você tem entorpecente no carro? Não? Mas... usa entorpecente?” Apontaram uma arma para o bandido imaginário que estava no meu porta-malas e olharam (de forma curiosamente paranoica) para um corretivo de pele que eu levava a uma amiga. “Mãos à cabeça! Abre as pernas!”
Somente o Doutor
Pangloss e Cândido podem acreditar que essa polícia estava e está
no campus para proteger a comunidade, não é mesmo? Preciso aqui
mencionar também Pollyanna e a Velhinha de Taubaté (personagem do
articulista Luis Fernando Verissimo), para as referências a Voltaire
não ficarem muito elitistas?
Que o senhor José Nêumanne Pinto seja conservador não temos a menor dúvida. Mas,
caro Nêumanne, comparar os estudantes que ocuparam a reitoria a
bandidos... perdeu a noção, senhor jornalista? Que tal tirar o
risinho do canto da boca e invocar algum espírito de medida (esse
que tanto atribuem aos franceses). Está com inveja do Reinaldo
Azevedo e do Diogo Mainardi, José Nêumanne? Você é mais
inteligente que isso – e pode ser melhor.
Os estudantes que se
proclamam “presos políticos”, senhor editorialista, não estavam
assaltando bancos. Nem traficando drogas. Ou estuprando, achacando,
subornando. Estavam utilizando um recurso (aprove-se ou não,
equivocado ou não) eminentemente político. Ou vocês não sabem que
sem ocupações não teríamos tido nem esse arremedo de reforma
agrária que tivemos no Brasil? Discordem, tomem as posições políticas –
mas com o mínimo de honestidade, é pedir demais?
Se for esse País
policialesco que desejam, jornalistas e donos do Estadão, digam.
Assumam. Mas não somente em relação à USP (onde talvez um de seus
filhos e netos ainda venha a estudar), mas para o País inteiro.
Sabendo, porém, exatamente que serpente estão criando. De Boa Vista
à Avenida Paulista.
O próprio jornal já
sofreu e sofre isso na pele. E, como possui pretensões políticas um
tanto mais refinadas, espero sinceramente que não queiram fazer o
mesmo tipo de jornalismo que O Estado do Maranhão – ou demais
veículos da família Sarney.
Vale lembrar, conforme notícia do portal Brasil 247, o que o promotor Valter Foleto Santin, do Ministério Público Estadual, abriu, em relação a João Rodas, o Inquérito Civil 088/2011, pela Promotoria do Patrimônio Público e Social. Ele é investigado por: “Violação aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, burla ao acesso de cargo mediante concurso público, lesão aos cofres públicos e improbidade administrativa”.
Ainda nesta
terça-feira, João Rodas começou a demolir os prédios que abrigam
o Núcleo de Consciência Negra – em um país onde o homicídio de
negros cresceu 23,4% nos últimos oito anos. (Que tal um editorial
sobre isso?)
José Sarney está lá,
onde sempre esteve.
João e José estão a postos. E não estão para brincadeira.
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