Ruralistas dominam ranking de congressistas “modernos” da Veja
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
A revista Veja desta semana traz uma lista que chama de “ranking do progresso”.
A lista na edição impressa é composta por 32 senadores e 54 deputados
“que mais trabalharam em 2013 por um país moderno e competitivo”. A
lista traz uma infinidade de ruralistas, em muitos casos nem um pouco
associados a qualquer noção condescendente de modernidade.
A
lista de ruralistas começa já no primeiro lugar entre os senadores:
Armando Monteiro (PTB-PE). Ele leva a nota 10. A revista dá nota 10 para
o político. Seu irmão, Eduardo de Queiroz Monteiro, tem empresa que já
esteve várias vezes na Lista Suja do Trabalho Escravo, a Destilaria Gameleira, renomeada para Destilaria Araguaia.
Número
2 da Veja? Senador Casildo Maldaner (PMDB-SC). Dono de 2.050 hectares
em São Félix do Xingu (PA), a capital da pecuária, terra de desmatamento
e de grilagem.
O quarto da lista é um dos políticos que mais
têm propriedades rurais: Eunício Oliveira (PMDB-CE). Em décimo lugar,
mais um ultraruralista: Romero Jucá (PMDB-RR), com interesses diretos no
setor da mineração.
O ruralista pouco assumido José Sarney
(PMDB-AP) aparece em 22º lugar nessa lista, com nota 6. Pouco abaixo, em
24º lugar, lá está ela: Kátia Abreu (PMDB-TO), a presidente da
Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), com nota 5,9.
O
último lugar na lista da revista impressa (a edição digital traz um
ranking mais completo) também é ocupado por um ruralista, Valdir Raupp
(PMDB-TO).
A lista de ruralistas entre os deputados associados
pela revista à palavra “progresso” também é inesgotável. Ela começa com
Onofre Agostini (PSD-SC), membro da Frente Parlamentar da Agropecuária,
um ex-arenista que também ganha nota 10 da Veja.
Em oitavo
lugar, com nota 8,4, aparece Leonardo Picciani (PMDB-RJ). Filho do
poderoso Jorge Picciani, que já figurou na Lista Suja do trabalho
escravo.
Ronaldo Caiado (DEM-GO) leva nota 7,8, em 20º lugar. A
lista com dezenas de ruralistas também tem outros políticos importantes
na defesa do agronegócio e dos latifúndios (indiscutivelmente
dissociados de qualquer ideia de “progresso”), como Moreira Mendes
(PSD-RO) e Arthur Lira (PP-AL).
A própria revista Veja, na
semana passada, publicou uma “reportagem” contra os indígenas no Mato
Grosso do Sul, a favor dos fazendeiros, com direito a foto de um deles
portando arma, com ameaças aos indígenas.
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jornalismo, geografia, literatura, cinema. Utopia, resistência. 'Indignem-se!' (Stéphane Hessel). 'Nem tudo é sórdido' (Ernesto Sabato - 1911-2011)
sábado, 21 de dezembro de 2013
domingo, 15 de dezembro de 2013
Deputado ruralista defende "cacete" em indígenas
A fala do deputado Giovanni Queiroz (PDT-BA) na quarta-feira não pode passar despercebida. Em audiência pública promovida pelos ruralistas, ele ensinou a "dar um cacete" em indígenas. Conforme relato de Luisa Molina no Diário Liberdade: "O Gatilho da ofensiva ruralista".
Segue trecho:
- Aplausos e expressões de satisfação rondaram o auditório quando o deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA), ao falar de como "lidaram" com "o problema indígena" no seu estado com violência. "Ninguém mais contrata advogado. Entrou hoje [indígena na terra], sai na madrugada do dia seguinte. Sai debaixo de cacete". Ele prossegue, aconselhando outros a contratarem empresas de segurança: "4 horas da manhã você aborda o pessoal [que entrou na terra], chega o cravo no primeiro que reclamar, dá-lhe um cacete, bota em cima de um caminhão e manda devolver".
Em 2010, o deputado latifundiário declarou R$ 10 milhões. Vejamos os três itens mais significativos:
-> Área Rural 4.356 Ha - Municipio De Pau Darco R$ 6.000.000,00
-> Área Rural 1.840 Ha Em Rio Maria R$ 2.000.000,00
-> 1.900 Cabeças De Gado R$ 1.500.000,00
Valor total dos bens declarados: R$ 10.421.200,00
Em 1998 ele possuía R$ 2,3 milhões. As duas fazendas já estavam lá, com valores menores, mas também significativos em relação ao total: R$ 1,2 milhão e R$ 555 mil.
Segundo o site A República dos Ruralistas, ele teve uma campanha eleitoral tímida, de R$ 487.750,00 em doações diretas, feitas por empresas do ramo sucroalcooleiro, frigoríficos e uma mineradora. Entre elas a a Cosan S/A Açúcar e Álcool, a Agropastoril do Araguaia Ltda, o Frigorífico Rio Maria Ltda e a Mineração Buritirama S/A.
Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)
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A fala do deputado Giovanni Queiroz (PDT-BA) na quarta-feira não pode passar despercebida. Em audiência pública promovida pelos ruralistas, ele ensinou a "dar um cacete" em indígenas. Conforme relato de Luisa Molina no Diário Liberdade: "O Gatilho da ofensiva ruralista".
Segue trecho:
- Aplausos e expressões de satisfação rondaram o auditório quando o deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA), ao falar de como "lidaram" com "o problema indígena" no seu estado com violência. "Ninguém mais contrata advogado. Entrou hoje [indígena na terra], sai na madrugada do dia seguinte. Sai debaixo de cacete". Ele prossegue, aconselhando outros a contratarem empresas de segurança: "4 horas da manhã você aborda o pessoal [que entrou na terra], chega o cravo no primeiro que reclamar, dá-lhe um cacete, bota em cima de um caminhão e manda devolver".
Em 2010, o deputado latifundiário declarou R$ 10 milhões. Vejamos os três itens mais significativos:
-> Área Rural 4.356 Ha - Municipio De Pau Darco R$ 6.000.000,00
-> Área Rural 1.840 Ha Em Rio Maria R$ 2.000.000,00
-> 1.900 Cabeças De Gado R$ 1.500.000,00
Valor total dos bens declarados: R$ 10.421.200,00
Em 1998 ele possuía R$ 2,3 milhões. As duas fazendas já estavam lá, com valores menores, mas também significativos em relação ao total: R$ 1,2 milhão e R$ 555 mil.
Segundo o site A República dos Ruralistas, ele teve uma campanha eleitoral tímida, de R$ 487.750,00 em doações diretas, feitas por empresas do ramo sucroalcooleiro, frigoríficos e uma mineradora. Entre elas a a Cosan S/A Açúcar e Álcool, a Agropastoril do Araguaia Ltda, o Frigorífico Rio Maria Ltda e a Mineração Buritirama S/A.
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sexta-feira, 6 de dezembro de 2013
Turbina explode, e trabalhador morre em usina. Quem liga?
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Notícia robótica na Folha: "Acidente mata trabalhador em usina". Mas só na Folha Ribeirão, que circula na região de Ribeirão Preto. Nome da vítima? Ah, qual a necessidade, não é mesmo? (Edson Aparecido Pinheiro, informa a Rede Anhanguera: http://correio.rac.com.br/_conteudo/2013/12/ig_paulista/130791-explosao-mata-um-e-fere-outro-em-usina-de-cana-de-acucar.html).
Circunstâncias da morte? A empresa Biosev não informa. (O G1, porém, conta que uma turbina explodiu: http://m.g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/noticia/2013/12/explosao-em-usina-mata-trabalhador-e-deixa-outro-ferido-em-sertaozinho.html.)
A usina atende pelo nome de Santa Elisa. Pertence ao grupo francês Louis Dreyfus, presente em mais de 50 países. (Santa Elisa, padroeira dos ferreiros, foi uma mártir egípcia. Decapitada.)
Segue a notícia robótica e gélida da Folha:
"Um acidente na área industrial da usina de cana-de-açúcar Santa Elisa, em Sertãozinho (a 333 km de São Paulo), matou um homem que trabalhava no local.
Outra pessoa também ficou ferida na ocorrência.
O acidente ocorreu no final da tarde de anteontem.
Em nota, a Biosev, empresa responsável pela usina, afirmou que lamenta a morte do funcionário e que oferece apoio aos familiares dele.
Entretanto, a Biosev não informou as circunstâncias do acidente que levaram à morte do trabalhador.
As causas do acidente serão investigadas pela Polícia Civil de Sertãozinho".
E é só. Registrado o protocolo jornalístico.
Em dezembro de 2008, a organização Amigos da Terra publicou os resultados do prêmio Pinóquio de desenvolvimento sustentável. O grupo Louis Dreyfus venceu na categoria direitos humanos, com 36% dos votos, pelo tratamento indigno aos assalariados brasileiros: http://www.prix-pinocchio.org/laureat-2008.php?id_rubrique=7
Mas hoje tem sorteio da Copa.
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por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Notícia robótica na Folha: "Acidente mata trabalhador em usina". Mas só na Folha Ribeirão, que circula na região de Ribeirão Preto. Nome da vítima? Ah, qual a necessidade, não é mesmo? (Edson Aparecido Pinheiro, informa a Rede Anhanguera: http://correio.rac.com.br/_conteudo/2013/12/ig_paulista/130791-explosao-mata-um-e-fere-outro-em-usina-de-cana-de-acucar.html).
Circunstâncias da morte? A empresa Biosev não informa. (O G1, porém, conta que uma turbina explodiu: http://m.g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/noticia/2013/12/explosao-em-usina-mata-trabalhador-e-deixa-outro-ferido-em-sertaozinho.html.)
A usina atende pelo nome de Santa Elisa. Pertence ao grupo francês Louis Dreyfus, presente em mais de 50 países. (Santa Elisa, padroeira dos ferreiros, foi uma mártir egípcia. Decapitada.)
Segue a notícia robótica e gélida da Folha:
"Um acidente na área industrial da usina de cana-de-açúcar Santa Elisa, em Sertãozinho (a 333 km de São Paulo), matou um homem que trabalhava no local.
Outra pessoa também ficou ferida na ocorrência.
O acidente ocorreu no final da tarde de anteontem.
Em nota, a Biosev, empresa responsável pela usina, afirmou que lamenta a morte do funcionário e que oferece apoio aos familiares dele.
Entretanto, a Biosev não informou as circunstâncias do acidente que levaram à morte do trabalhador.
As causas do acidente serão investigadas pela Polícia Civil de Sertãozinho".
E é só. Registrado o protocolo jornalístico.
Em dezembro de 2008, a organização Amigos da Terra publicou os resultados do prêmio Pinóquio de desenvolvimento sustentável. O grupo Louis Dreyfus venceu na categoria direitos humanos, com 36% dos votos, pelo tratamento indigno aos assalariados brasileiros: http://www.prix-pinocchio.org/laureat-2008.php?id_rubrique=7
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quinta-feira, 7 de novembro de 2013
Um texto sobre ciganos para ser lido: no espanhol El País
O espanhol El País publicou há cinco dias um belo texto sobre ciganos franceses, que ali tiveram um campo de concentração específico - não nazista. Com aquela qualidade que o jornalismo brasileiro não costuma ter. Está disponível, gratuitamente, na internet: http://internacional.elpais.com/internacional/2013/11/02/actualidad/1383422739_935400.html
O UOL oferece o artigo traduzido, mas somente para assinantes. Pior: transformou o texto original, de 26 parágrafos, em um de 18 parágrafos. O original de 2.081 palavras foi desidratado quase pela metade: virou um guisado de 1.255 palavras. Ora, se é online, por que essa transfiguração? Estão economizando o quê?
Mas deixemos o UOL de lado. Esse texto do El País tem o mérito de tocar o dedo na ferida em relação às infâmias praticadas contra os ciganos. Infâmias que, historicamente, anunciaram desastres humanitários ainda maiores. "Artistas e intelectuais franceses alertam para a amnésia e os novos sintomas racistas", diz outra chamada. "A perseguição aos romanis antecedeu as duas guerras mundiais".
Roubo de crianças? Os europeus paranóicos costumam acusar os ciganos. Como há bem pouco tempo, com a criança loirinha. Mas foi esse campo de concentração francês que tirou as crianças ciganas dos pais. O repórter pergunta (mas não está na tradução): "¿quién ha robado niños a quién a lo largo de la historia?"
E com isso me lembro de reportagem racista assinada pela Veja, há algumas semanas, por seu correspondente em Paris. Com todo o discurso deplorado pelo texto espanhol: o preconceito, a ausência de humanismo. E o diálogo com aquele passado asqueroso que resultou em genocídio - proporcionalmente idêntico ao dos judeus.
Ao contrário dos judeus, não houve indenização nem compensação moral para os ciganos. Pois o caso não ficou na memória coletiva.
"Quizá por eso, la persecución dura todavía", escreve o repórter. Talvez por isso a perseguição ainda continue. (Os dois últimos parágrafos também foram cortados, arrisco-me na tradução.)
"Entre la indiferencia general, los prejuicios atávicos alentados por los medios, la comprensible renuencia de un pueblo masacrado a exigir justicia –ya sea de forma individual o colectiva-, y el consenso infernal que suscitan entre los políticos de las democracias neoliberales, los gitanos siguen siendo el perfecto chivo expiatorio, la primera señal de alarma de que algo muy profundo no va bien".
Em meio à indiferença geral, os preconceitos atávicos estimulados pelos meios de comunicação, a compreensível relutância de um povo massacrado em exigir justiça - seja de forma individual ou coletiva -, e o consenso infernal que eles suscitam entre os políticos das democracias neoliberais, os ciganos continuam sendo o perfeito bode expiatório, o primeiro sinal de alarme de que algo muito profundo não vai bem.
UOL, que tal traduzir direito o texto e liberar para os não assinantes?
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O espanhol El País publicou há cinco dias um belo texto sobre ciganos franceses, que ali tiveram um campo de concentração específico - não nazista. Com aquela qualidade que o jornalismo brasileiro não costuma ter. Está disponível, gratuitamente, na internet: http://internacional.elpais.com/internacional/2013/11/02/actualidad/1383422739_935400.html
O UOL oferece o artigo traduzido, mas somente para assinantes. Pior: transformou o texto original, de 26 parágrafos, em um de 18 parágrafos. O original de 2.081 palavras foi desidratado quase pela metade: virou um guisado de 1.255 palavras. Ora, se é online, por que essa transfiguração? Estão economizando o quê?
Mas deixemos o UOL de lado. Esse texto do El País tem o mérito de tocar o dedo na ferida em relação às infâmias praticadas contra os ciganos. Infâmias que, historicamente, anunciaram desastres humanitários ainda maiores. "Artistas e intelectuais franceses alertam para a amnésia e os novos sintomas racistas", diz outra chamada. "A perseguição aos romanis antecedeu as duas guerras mundiais".
Roubo de crianças? Os europeus paranóicos costumam acusar os ciganos. Como há bem pouco tempo, com a criança loirinha. Mas foi esse campo de concentração francês que tirou as crianças ciganas dos pais. O repórter pergunta (mas não está na tradução): "¿quién ha robado niños a quién a lo largo de la historia?"
E com isso me lembro de reportagem racista assinada pela Veja, há algumas semanas, por seu correspondente em Paris. Com todo o discurso deplorado pelo texto espanhol: o preconceito, a ausência de humanismo. E o diálogo com aquele passado asqueroso que resultou em genocídio - proporcionalmente idêntico ao dos judeus.
Ao contrário dos judeus, não houve indenização nem compensação moral para os ciganos. Pois o caso não ficou na memória coletiva.
"Quizá por eso, la persecución dura todavía", escreve o repórter. Talvez por isso a perseguição ainda continue. (Os dois últimos parágrafos também foram cortados, arrisco-me na tradução.)
"Entre la indiferencia general, los prejuicios atávicos alentados por los medios, la comprensible renuencia de un pueblo masacrado a exigir justicia –ya sea de forma individual o colectiva-, y el consenso infernal que suscitan entre los políticos de las democracias neoliberales, los gitanos siguen siendo el perfecto chivo expiatorio, la primera señal de alarma de que algo muy profundo no va bien".
Em meio à indiferença geral, os preconceitos atávicos estimulados pelos meios de comunicação, a compreensível relutância de um povo massacrado em exigir justiça - seja de forma individual ou coletiva -, e o consenso infernal que eles suscitam entre os políticos das democracias neoliberais, os ciganos continuam sendo o perfeito bode expiatório, o primeiro sinal de alarme de que algo muito profundo não vai bem.
UOL, que tal traduzir direito o texto e liberar para os não assinantes?
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terça-feira, 5 de novembro de 2013
Quem seria eleito no Brasil? O Rei do Camarote, Antonio Prata ou Paulo Maluf?
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Se o Rei do Camarote sair para deputado, será eleito.
Se o Antonio Prata sair, não será eleito.
Se o Paulo Maluf sair, será eleito.
Pois o nivelamento ocorre por baixo. A ostentação de riquezas ou a ostentação de poder (mesmo que por corrupção) atingem mais o público brasileiro médio do que a ironia. Ou a capacidade analítica.
(E não vou nem falar aqui da defesa coesa e sistemática de posições densas e fundamentadas em relação a temas-chave da sociedade brasileira: da questão urbana à agrária, dos nós da segurança pública ao sistema político. Isso deve eleger, no máximo, um ou dois deputados em algumas Unidades da Federação.)
É a camarotização da opinião pública brasileira. As urnas recebem, a cada dois anos, votos de quem não entendeu o Antonio Prata - o próprio Alexander, o Rei do Camarote, não entenderia aquele artigo baseado em ironias - e de quem apenas gostaria de estar no lugar do empresário, a espocar champanhes.
Votamos em reis, em representações caricaturais, em reduções da realidade. Mesmo que bufos. No rei da corrupção, no príncipe do direito do consumidor, no militar que desanca direitos humanos. E em coronéis, em imperadores de territórios implodidos.
Florestan Fernandes teria sérias dificuldades de ser eleito para a Câmara, hoje. Se há inveja em nossa sociedade, como diagnostica o Rei do Camarote, é em relação à detenção do conhecimento. Quem poderia discutir com mais propriedade o genocídio na periferia, a grilagem estrutural de nosso território, as medidas necessárias para a diminuição dos estupros, e tantos outros assuntos cruciais, não será eleito.
E não é somente que não será eleito. Não será nem discutido em uma escala razoável. Pois suas visões de mundo não repercutem. E não repercutem porque não viram memes. Memes são filhos do Willy Wonka (o Rei do Chocolate). Memes são bufos. Votos em Tiriricas e Enéas - mas também em Bolsonaros e Felicianos - são primos desses memes.
O mais performático e genial dos intelectuais políticos, um Darcy Ribeiro, não mais seria eleito para o Senado. Antropólogo? Defensor dos indígenas, da educação? Que cafona. Não usava Armani, não é amigo da Turma do Pânico. Não assistiria o Pânico. E escrevia uns períodos imensos.
Celebra-se e perpetua-se no Brasil uma linguagem cada vez menos enriquecedora. Menos complexa, menos complexificadora. E a pobreza da política apenas reflete esse movimento. Da capa da Vejinha ao horror de ler um texto até o final.
(Ou eu estou louco e não estou percebendo a repercussão de dissertações e teses, de artigos científicos e jornalísticos consistentes, de análises críticas, de sacadas geniais, de sutilezas acadêmicas e de raciocínios complexos? Ora, dirão, são poucos os que têm acesso a tudo isso. São mesmo?)
A hipertrofia do Rei do Camarote só ocorre pela força da camarotização. No país dos abadás e dos vallets, das ruas fechadas para moradores ricos e dos pedágios. Do patrimonialismo assimilado, da mesquinharia lúdica e exibicionista, da política como extensão de horizontes privatizados.
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por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Se o Rei do Camarote sair para deputado, será eleito.
Se o Antonio Prata sair, não será eleito.
Se o Paulo Maluf sair, será eleito.
Pois o nivelamento ocorre por baixo. A ostentação de riquezas ou a ostentação de poder (mesmo que por corrupção) atingem mais o público brasileiro médio do que a ironia. Ou a capacidade analítica.
(E não vou nem falar aqui da defesa coesa e sistemática de posições densas e fundamentadas em relação a temas-chave da sociedade brasileira: da questão urbana à agrária, dos nós da segurança pública ao sistema político. Isso deve eleger, no máximo, um ou dois deputados em algumas Unidades da Federação.)
É a camarotização da opinião pública brasileira. As urnas recebem, a cada dois anos, votos de quem não entendeu o Antonio Prata - o próprio Alexander, o Rei do Camarote, não entenderia aquele artigo baseado em ironias - e de quem apenas gostaria de estar no lugar do empresário, a espocar champanhes.
Votamos em reis, em representações caricaturais, em reduções da realidade. Mesmo que bufos. No rei da corrupção, no príncipe do direito do consumidor, no militar que desanca direitos humanos. E em coronéis, em imperadores de territórios implodidos.
Florestan Fernandes teria sérias dificuldades de ser eleito para a Câmara, hoje. Se há inveja em nossa sociedade, como diagnostica o Rei do Camarote, é em relação à detenção do conhecimento. Quem poderia discutir com mais propriedade o genocídio na periferia, a grilagem estrutural de nosso território, as medidas necessárias para a diminuição dos estupros, e tantos outros assuntos cruciais, não será eleito.
E não é somente que não será eleito. Não será nem discutido em uma escala razoável. Pois suas visões de mundo não repercutem. E não repercutem porque não viram memes. Memes são filhos do Willy Wonka (o Rei do Chocolate). Memes são bufos. Votos em Tiriricas e Enéas - mas também em Bolsonaros e Felicianos - são primos desses memes.
O mais performático e genial dos intelectuais políticos, um Darcy Ribeiro, não mais seria eleito para o Senado. Antropólogo? Defensor dos indígenas, da educação? Que cafona. Não usava Armani, não é amigo da Turma do Pânico. Não assistiria o Pânico. E escrevia uns períodos imensos.
Celebra-se e perpetua-se no Brasil uma linguagem cada vez menos enriquecedora. Menos complexa, menos complexificadora. E a pobreza da política apenas reflete esse movimento. Da capa da Vejinha ao horror de ler um texto até o final.
(Ou eu estou louco e não estou percebendo a repercussão de dissertações e teses, de artigos científicos e jornalísticos consistentes, de análises críticas, de sacadas geniais, de sutilezas acadêmicas e de raciocínios complexos? Ora, dirão, são poucos os que têm acesso a tudo isso. São mesmo?)
A hipertrofia do Rei do Camarote só ocorre pela força da camarotização. No país dos abadás e dos vallets, das ruas fechadas para moradores ricos e dos pedágios. Do patrimonialismo assimilado, da mesquinharia lúdica e exibicionista, da política como extensão de horizontes privatizados.
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quarta-feira, 16 de outubro de 2013
15 de outubro de 2013, São Paulo: a “batalha da algema”
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Observem a partir de 2min25seg, no vídeo. O policial berra várias vezes, durante repressão a manifestação de professores e estudantes, em São Paulo: "Avante, algema! Avante, algema!"
Nada poderia ser mais expressivo. Essa é a política pública de educação mais bem definida em relação aos professores paulistas. "Algeeema!! Algema!!!" (É como se a algema fosse invocada como uma tábua de salvação, aquela que vai solucionar os nossos problemas. E de uma forma personalizada, como se ali fosse surgir uma senhora respeitável, uma velha conhecida.)
Essa é também a política pública mais bem definida em relação aos desmandos de um reitor retrógrado da USP, um salazarista. "Algeeema!! Algema!!!" (Já que não puderam prender os estudantes e torturá-los na reitoria da USP, como em 2011, que se demonstre essa autoridade chinfrim nas ruas. A mesma autoridade perdida em décadas de perpetuação de uma lógica policial verde-oliva.)
E essa é, ainda, a política pública de segurança mais populista, ilusionista e cínica de que se possa ter conhecimento. E mais suicida, mais degradadora dos tecidos de cidadania mais elementares. "Algeeeemas!", esgoela-se o comandante. E não só algemas: este vídeo escancara um oneroso e multiplicado arsenal repressivo. A nossa polícia está ali, a postos, de helicóptero e tudo. Contra o PCC? Traficantes de armas, ladrões de cargas? Contra o Comando Vermelho, o exército americano? Não. Não exatamente. Contra cidadãos algemáveis.
Vale observar, ao contrário do senso comum e das usurpações, que não existem black blocs; existem pessoas, existem indivíduos, cidadãos. Um fato singelo que não aparece, convenientemente, nas narrativas das operações policiais. E que, apesar da eventual violência de alguns manifestantes, evidentemente aguardada por esses meticulosos algemadores, estas imagens são a evidência de que esse sistema de repressão está falido. Que não há espaço para a militarização de polícias.
E que essa repressão virou entretenimento. Um repórter exclama, indignadíssimo: "A imprensa tem direito". (Em seguida ouve-se um disparo.) Claro que tem. Todos têm. Todos deveriam ter. O problema é que a ausência de noção mínima de democracia, em qualquer grupo social (inclusive manifestantes), tem sido multiplicada por essa mesma polícia cujas ações parte da imprensa celebra. Há um aval midiático para que o Estado engate essa gigantesca marcha a ré. (Sim, é ele quem a engata.)
Esse patrocínio parte da imprensa e parte da sociedade. No caso, a sociedade paulista, tão orgulhosa de seus bandeirantes. O mesmo lúmpen intelectual que se jubila com o vídeo de um bandido sendo baleado (acreditando candidamente que, agora sim, a violência refluirá...), irresponsavelmente turbinado pelos meios de comunicação, é quem dá aval a esse tipo de política do atordoamento, essa estética do gás lacrimogêneo, esse Estado enredado em algemas.
(Será que em breve o artefato estará à venda na Tok Stok?)
"Algemas! Algeeeeeemas!" Muitas algemas, público paulista! "Com licença, Dona Algema. Prenda mais este professor!" Menos aulas de geografia e história! Que se perpetuem os salários abomináveis! Quem precisa de educação? "Algeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeemas!!!!"
* com a licença de Gillo Pontecorvo, o diretor italiano do clássico “A Batalha de Argel”.
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por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Observem a partir de 2min25seg, no vídeo. O policial berra várias vezes, durante repressão a manifestação de professores e estudantes, em São Paulo: "Avante, algema! Avante, algema!"
Nada poderia ser mais expressivo. Essa é a política pública de educação mais bem definida em relação aos professores paulistas. "Algeeema!! Algema!!!" (É como se a algema fosse invocada como uma tábua de salvação, aquela que vai solucionar os nossos problemas. E de uma forma personalizada, como se ali fosse surgir uma senhora respeitável, uma velha conhecida.)
Essa é também a política pública mais bem definida em relação aos desmandos de um reitor retrógrado da USP, um salazarista. "Algeeema!! Algema!!!" (Já que não puderam prender os estudantes e torturá-los na reitoria da USP, como em 2011, que se demonstre essa autoridade chinfrim nas ruas. A mesma autoridade perdida em décadas de perpetuação de uma lógica policial verde-oliva.)
E essa é, ainda, a política pública de segurança mais populista, ilusionista e cínica de que se possa ter conhecimento. E mais suicida, mais degradadora dos tecidos de cidadania mais elementares. "Algeeeemas!", esgoela-se o comandante. E não só algemas: este vídeo escancara um oneroso e multiplicado arsenal repressivo. A nossa polícia está ali, a postos, de helicóptero e tudo. Contra o PCC? Traficantes de armas, ladrões de cargas? Contra o Comando Vermelho, o exército americano? Não. Não exatamente. Contra cidadãos algemáveis.
Vale observar, ao contrário do senso comum e das usurpações, que não existem black blocs; existem pessoas, existem indivíduos, cidadãos. Um fato singelo que não aparece, convenientemente, nas narrativas das operações policiais. E que, apesar da eventual violência de alguns manifestantes, evidentemente aguardada por esses meticulosos algemadores, estas imagens são a evidência de que esse sistema de repressão está falido. Que não há espaço para a militarização de polícias.
E que essa repressão virou entretenimento. Um repórter exclama, indignadíssimo: "A imprensa tem direito". (Em seguida ouve-se um disparo.) Claro que tem. Todos têm. Todos deveriam ter. O problema é que a ausência de noção mínima de democracia, em qualquer grupo social (inclusive manifestantes), tem sido multiplicada por essa mesma polícia cujas ações parte da imprensa celebra. Há um aval midiático para que o Estado engate essa gigantesca marcha a ré. (Sim, é ele quem a engata.)
Esse patrocínio parte da imprensa e parte da sociedade. No caso, a sociedade paulista, tão orgulhosa de seus bandeirantes. O mesmo lúmpen intelectual que se jubila com o vídeo de um bandido sendo baleado (acreditando candidamente que, agora sim, a violência refluirá...), irresponsavelmente turbinado pelos meios de comunicação, é quem dá aval a esse tipo de política do atordoamento, essa estética do gás lacrimogêneo, esse Estado enredado em algemas.
(Será que em breve o artefato estará à venda na Tok Stok?)
"Algemas! Algeeeeeemas!" Muitas algemas, público paulista! "Com licença, Dona Algema. Prenda mais este professor!" Menos aulas de geografia e história! Que se perpetuem os salários abomináveis! Quem precisa de educação? "Algeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeemas!!!!"
* com a licença de Gillo Pontecorvo, o diretor italiano do clássico “A Batalha de Argel”.
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segunda-feira, 14 de outubro de 2013
Universalização do saneamento, no Brasil, só em 2122. Quem liga?
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
O jornal Valor Econômico informa, em repercussão aos debates do 3º Encontro de Saneamento Básico, promovido pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) na quarta-feira, dia 9 de outubro:
- Mantido o ritmo atual de investimentos, que chegam por ano a 0,2% do PIB, um terço dos 0,6% necessários, a universalização só seria atingida no próximo século, em 2122, quase 90 anos além do prazo estabelecido.
Não, não há um erro de digitação. É 2122 mesmo, e não 2022. Daqui a 109 anos, portanto.
Não se trata do único atraso: o jornal deu a notícia somente nesta segunda-feira, dia 14. Cinco dias após a divulgação dos números.
Elas não motivaram uma manchete do jornal. Do tipo: “Brasil só terá saneamento universal em 2122”. A informação é dada com discrição, em um dos textos de especial sobre saneamento. Sem que o dado mereça o título – reservado a algo sobre “choque de gestão”.
Desta forma não se gera indignação, portanto. Saneamento universal só em 2122? Ah, logo ali. Um assunto para a indignação dos bisnetos do Gigante Adormecido.
Note-se que quem está dizendo tudo isso é a Fiesp. E não uma fonte de esquerda. Um dos diretores da Federação das Indústrias conta que também estamos em nono lugar no ranking dos países com menos banheiros no planeta. (Sim, isso mesmo. Só oito países têm piores índices que os nossos em relação à existência de banheiros.)
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
O jornal Valor Econômico informa, em repercussão aos debates do 3º Encontro de Saneamento Básico, promovido pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) na quarta-feira, dia 9 de outubro:
- Mantido o ritmo atual de investimentos, que chegam por ano a 0,2% do PIB, um terço dos 0,6% necessários, a universalização só seria atingida no próximo século, em 2122, quase 90 anos além do prazo estabelecido.
Não, não há um erro de digitação. É 2122 mesmo, e não 2022. Daqui a 109 anos, portanto.
Não se trata do único atraso: o jornal deu a notícia somente nesta segunda-feira, dia 14. Cinco dias após a divulgação dos números.
Elas não motivaram uma manchete do jornal. Do tipo: “Brasil só terá saneamento universal em 2122”. A informação é dada com discrição, em um dos textos de especial sobre saneamento. Sem que o dado mereça o título – reservado a algo sobre “choque de gestão”.
Desta forma não se gera indignação, portanto. Saneamento universal só em 2122? Ah, logo ali. Um assunto para a indignação dos bisnetos do Gigante Adormecido.
Note-se que quem está dizendo tudo isso é a Fiesp. E não uma fonte de esquerda. Um dos diretores da Federação das Indústrias conta que também estamos em nono lugar no ranking dos países com menos banheiros no planeta. (Sim, isso mesmo. Só oito países têm piores índices que os nossos em relação à existência de banheiros.)
Conclui-se, portanto, que, se a Fiesp está dizendo isso, é sinal de que a
esquerda ocupará os plenários da Câmara e do Senado com discursos ainda mais
enfáticos. Militantes de partidos da oposição dirão que essa situação é
intolerável. Uma comoção e movimentos de solidariedade tomarão conta do país.
Iniciativas assistencialistas, mobilizações religiosas em torno da caridade, financiamento coletivo. A Rede Globo deve estar inquieta; os black blocs, furiosos.
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