segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Por uma Marcha dos Amarildos

por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)

O dia 12 de agosto marca os 30 anos do assassinato da líder sindical Margarida Maria Alves, camponesa de Alagoa Grande, na Paraíba. O caso gerou muita revolta na época. Entre os acusados estava Aguinaldo Velloso Borges, político, coronel. Em 1962 ele já fora acusado de mandar matar João Pedro Teixeira, o “Cabra Marcado para Morrer” do filme de Eduardo Coutinho. Naquele ano um deputado estadual e quatro suplentes renunciaram para que Borges assumisse o cargo na Assembleia e ganhasse imunidade. Em 1990, ele morreu. Seu neto, homônimo, é o atual ministro das Cidades.

Borges era bem relacionado, como mostro no livro “Partido da Terra – como os políticos conquistam o território brasileiro”. Nove dias após o assassinato de Margarida, ele recebia o deputado Paulo Maluf, então candidato à Presidência. Um jornal local descrevia o usineiro como líder de um grupo de três deputados federais, cinco deputados estaduais, 50 prefeitos. Controlava 27 representantes da Paraíba no Colégio Eleitoral que definiria o próximo presidente. Maluf perderia para Tancredo Neves.

Trinta anos depois, o neto de Tancredo tenta a presidência da República, pelo PSDB. Sem despertar maiores emoções. O Partido dos Trabalhadores chegou ao poder sem fazer reforma agrária. A presidente Dilma Rousseff busca a reeleição com um aliado polêmico: o governador do Rio, Sérgio Cabral Filho (PMDB).
 

A sociedade brasileira – e fluminense – faz em coro uma pergunta simples ao governador: “Onde está o Amarildo?”

O pedreiro Amarildo Dias de Souza desapareceu na Rocinha no dia 14 de julho, após ser levado, “para averiguação”, para a sede da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Tinha 43 anos. Provavelmente foi assassinado. A sociedade quer saber não apenas onde está Amarildo, mas que sejam investigados seus algozes. O responsável (ao que tudo indica, o Estado), devidamente punido.

As duas histórias têm cara de ditadura. No fim do regime militar, Margarida foi vítima de um crime que continua a ocorrer, no campo, em tempos democráticos. Com assinatura de fazendeiros, de políticos, e proteção sistemática da Justiça. É por causa dessa violação sistemática de direitos de trabalhadoras rurais que a Contag e outras entidades sindicais organizam, a cada quatro anos, a Marcha das Margaridas.

Durante dias as trabalhadoras rurais marcham do interior do Brasil até Brasília. Por visibilidade. Para os milhões de Margaridas no Brasil. Em 2011 a Marcha das Margaridas teve como lema desenvolvimento sustentável com justiça, autonomia, igualdade e liberdade.

Esta liberdade também se mostra ausente no mundo urbano – e masculino. No Rio, Amarildo era conhecido como “Boi”. Forte, e na ausência do Estado, ele carregava as pessoas que precisavam de socorro, em meio às escadas da favela, para que fossem atendidas com urgência em um hospital. Era um herói – ainda não reconhecido.

As lutas da cidade e do campo são uma só. Ou pelo menos deveriam ser. É por isso que lanço aqui uma ideia singela: por que não se pensar em fazer, de quatro em quatro anos, uma Marcha dos Amarildos? Não só pelos desaparecidos e assassinados. Mas por todos os ameaçados, humilhados.

Em 2015 teremos novamente uma Marcha das Margaridas. Em pauta, os direitos no campo. E em 2013? 2017? A Marcha dos Amarildos seria um ato-espelho, uma homenagem a todos os heróis urbanos. E reivindicaria o direito à cidade.

Marcha das Margaridas e Marcha dos Amarildos cobrariam de nossos governantes o respeito aos direitos elementares dos trabalhadores, dos cidadãos. A começar do direito à vida, à liberdade de ir e vir – sem que uma polícia “pacificadora” violente seus direitos.

Esses direitos rasgados diariamente compõem uma democracia pela metade. Nos anos pares, como 2014, temos eleições. Com financiamento privado, compra de votos, abuso do poder econômico. Mesmo assim políticos e jornalistas deslumbrados (ou cínicos) descrevem os pleitos como uma “festa da democracia”.

A democracia precisa ser cobrada nas ruas. Com a mesma dignidade das mulheres camponesas. A Marcha das Margaridas precisa se encontrar com a Marcha dos Amarildos.

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