Sobre Feliciano, Calheiros. E sobre analfabetismo
político e midiático
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)
Do jeito que as coisas vão no cenário político brasileiro, duas coisas: 1) a bancada evangélica fundamentalista só crescerá ao longo dos anos; 2) a bancada ruralista, cada vez mais santificada, continuará dando as cartas no Congresso. Cito dois exemplos mais conhecidos, entre outras bancadas movidas a conflito de interesses: empreiteiras, ensino privado, saúde privada etc.
Interesse público, na atividade desses
excelentíssimo senhores? Estamos longe disso. Com as honrosas
exceções. Mas não dá para seguirmos canalizando as nossas
indignações para uma estrada estéril. Ou para uma nuvem etérea,
ineficaz, distante da política real. É possível,
sim, equilibrar utopia e pragmatismo. Ocorre que isso exige um
combate rigoroso à ingenuidade.
Passou da hora dessa gente bronzeada pensar a
política como um todo. As indignações específicas são
bem-vindas, desde que inseridas numa percepção maior do que é o
sistema partidário, do que é o sistema eleitoral. Marco Feliciano,
Jair Bolsonaro, Renan Calheiros? Podemos desprezar mais ou menos este ou aquele (eu
voto nesse terceiro senhor, muito mais poderoso), mas os problemas
estão bem mais embaixo.
Ou seja, entre petições virtuais, protestos
reais e gritos nas redes sociais, precisamos participar mais
efetivamente da vida política. Efetividade, nesse caso, implica um
grau muito maior de informações sobre como funcionam as
instituições: o Congresso, o sistema representativo, o Judiciário,
a imprensa.
Isso passa pela revogação do anafalbetismo
midiático. Ou seja, pela noção de que a imprensa graúda se
movimenta em ondas, de acordo com interesses específicos. O caos
informativo (que os donos dos meios de comunicação definem como
exercício de democracia...) é apenas aparente. Que o diga a questão
agrária – violentamente reduzida, nos grandes jornais, a
“invasões” dos sem-terra contra pobres proprietários impolutos.
O refinamento de nossa percepção política exige
uma disposição muito maior para obter informações. Seja na
academia, seja em meios alternativos: livros, novas mídias. Estamos dispostos a alavancar
essa rede de informações contra-hegemônicas? Financiá-la,
inclusive?
As discussões regulares sobre temas estruturais também são
necessárias. A relação entre os problemas, também. Trata-se de um
sistema cheio de buracos, e não apenas de um nome ou outro mal
escolhido, de um ou outro personagem sórdido, que seria uma
excrescência do sistema. Estamos dispostos a reservar parte de nosso
tempo semanal para esse debate? (Esse combate necessário?)
Se não tivermos essa visão de conjunto nossa
indignação seguirá enxugando gelo. Os genocídios no trânsito, no
campo, as agressões a mulheres e a homossexuais, a corrupção, a
especulação imobiliária, a violência urbana (inclusive a policial) compõem uma mesma
sinfonia do desprezo à vida, um mesmo concerto de celebração do
lucro a qualquer custo, do oportunismo como valor inevitável.
Sem essa percepção orgânica cada brasileiro
indignado poderá incorrer no erro de atacar numa ponta o que pratica
na outra. De ser o psicótico que gruda na traseira do carro da
frente enquanto acha que o mensalão foi a pior – e única –
manifestação de que há algo errado na política. É tempo de
observar o quanto o cinismo brasiliense não reflete o cinismo
perpetuado diariamente em nossa sociedade violenta.
Quando falo de uma indignação “em ponta de
faca”, enxugando gelo, devo assinalar que esse costuma ser um passo
provável - e despolitizado- para o desânimo.
Desistências e indiferença alimentam diariamente o jogo dos inimigos. Os gritos por cidadania não podem ser apenas espasmos, performances sem maiores consequências. Devem ser canalizados para ações conjuntas – e racionais - por outras bancadas parlamentares (e estas são fundamentais), outras visões de mundo, outras práticas, outro fôlego, outra política.
Desistências e indiferença alimentam diariamente o jogo dos inimigos. Os gritos por cidadania não podem ser apenas espasmos, performances sem maiores consequências. Devem ser canalizados para ações conjuntas – e racionais - por outras bancadas parlamentares (e estas são fundamentais), outras visões de mundo, outras práticas, outro fôlego, outra política.
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